Cientistas estudam vírus da varíola do macaco para descobrir porque transmissão está rápida
Reprodução/Reuters

Os primeiros resultados do sequenciamento genômico do vírus da varíola do macaco, que estão sendo feitos em Portugal, surpreenderam pesquisadores. Todos os resultados já processados apontam uma média de 50 mutações (polimorfismos de nucleotideos), o que já é suficiente para diferenciar este vírus do surto anterior observado em 2018/2019 em países da África, em Israel, Singapura e no Reino Unido. 

“Comparando o genoma de agora com os já disponíveis, ele é similar ao dos casos sequenciados em 2017 a 2019, na África, Israel e Reino Unido, mas tem cerca de 47 mutações em relação aos anteriores, o que é muito. Foi meio inesperado para esse tipo de vírus”, afirma Camila Malta pesquisadora do Laboratório de Investigação Médica do Hospital das Clínicas da FMUSP (Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo) e do Instituto de Medicina Tropical.

A cientista chama atenção para o fato de normalmente serem observadas de uma a duas mutações deste vírus por ano.

“O que se viu agora é que parece que ele está evoluindo mais rapidamente. […] Os cerca de dez virus sequenciados já apresentam algumas poucas – de duas a três – mutacoes entre si, o que comprova que a taxa evolutiva desse virus aparentemente está mais rapida.” 

Uma das hipóteses levantadas pelos cientistas para explicar a transmissão rápida da doença e em locais sem uma conexão evidente é que o chamado ortopoxvírus tenha sofrido mutações, o que facilitaria uma maior disseminação da doença entre humanos.

Mesmo com a surpresa, Camila ressalta que ainda não é possível confirmar essa hipótese com as análises de genoma disponíveis.

“Ainda é cedo para dizer, pois a única análise mais detalhada feita nesses genomas observou que a maioria das mutações parecem ser neutras ou deletérias, ou seja, não são ‘boas’ para o vírus.”

As mudanças podem ser uma resposta contra a infecção.

“Elas podem ser fruto de uma pressão seletiva do hospedeiro, tentando eliminar o vírus. Uma certa enzima, chamada APOBEC funciona na gente como um antiviral, pois induz mutações nos vírus a medida que se replicam. Essas mutações têm um padrão específico – e justamente é o padrão encontrado nas mutações do monkeypox [nome em inglês] do surto de agora”, explica a bióloga.

Todavia, também é possível que as mutações tenham surgido ao longo do tempo sem que houvesse amostras disponíveis para comparação. Outra linha de investigação é de um vírus que acumulou muitas mutações em um curto espaço de tempo (hipermutado) por consequência da enzima APOBEC.

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E resume: “Pode ser que essas mutações já são fruto de uma tentativa do hospedeiro controlar o vírus. E não o contrário, ou seja, uma adaptação do vírus para ser mais transmissível.”

As mutações do patógeno que causa a varíola do macaco são mais difíceis por ele ser um vírus de DNA. Diferentemente do SARS-CoV-2, que causa da Covid-19, que é de RNA e muda mais rapidamente.

Desde a erradicação global da varíola tradicional – declarada em 1980 –, a varíola do macaco emergiu como a infecção por ortopoxvírus mais prevalente em humanos.

Em entrevista na semana passada, o chefe da Unidade de Bioinformática do Departamento de Doenças Infecciosas do INSA (Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge) de Portugal, João Paulo Gomes, afirmou que o vírus detectado no país é menos agressivo do que o tipo que se espalha na África Ocidental.

“Em teoria, evolui mais do que estávamos à espera. Eventualmente mais tarde poderemos perceber que estas características genômicas podem estar associadas a uma maior transmissibilidade, ainda não sabemos”, disse o pesquisador, segundo a agência de notícias chinesa Xinhua.

Portugal é o terceiro país do mundo em número de diagnósticos positivos, com cem casos, atrás apenas de Espanha e Inglaterra. 

“A situação está evoluindo rapidamente e a OMS espera que haja mais casos identificados à medida que a vigilância se expande em países não endêmicos, bem como em países conhecidos como endêmicos que não relataram casos recentemente”, disse a OMS (Organização Mundial da Saúde) em comunicado emitido no último dia 29. 

Arte/R7

 

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