A espeleóloga Teresa Aragão contraiu a “doença da caverna” em caverna no Rio
Arquivo Pessoal
“Eu me sentia como uma velha. Só conseguia andar bem devagar. Minha capacidade pulmonar piorou drasticamente”. Assim se sentiu a professora de artes plásticas e espeleóloga Teresa Aragão, 62, ao contrair a histoplasmose, conhecida como “doença da caverna”.
Ela e mais cinco pessoas do grupo que liderava pegaram a doença durante uma expedição em uma caverna em Resende, no Rio de Janeiro.
“Estava um cheiro muito forte de guano [fezes de morcego] nessa caverna. É um odor de terra molhada com leve traço de amônia. Depois viemos a saber que Resende tinha passado por um surto de histoplasmose, com mais de 100 casos”, diz ela, que explora cavernas desde a década de 1970.
A histoplasmose é uma das principais doenças a serem analisadas nos 12 “meninos da caverna”, que foram resgatados após 18 dias em uma caverna inundada na Tailândia.
A doença é causada por um fungo presente nas fezes de morcego ou de aves contaminados, que, ao ser inalado, provoca inflamação nos pulmões.
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A infectologista Rosana Richtmann, do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, em São Paulo, explica que a histoplasmose costuma ser assintomática, mas os sintomas, quando se manifestam, aparecem em duas semanas. São febre baixa, tosse e falta de ar. “As crianças da Tailândia deverão ficar em observação enquanto são feitos exames para saber se foram colonizadas por esses fungos”, afirma.
O diagnóstico é feito por exame de sangue, biópsia ou cultura, por meio da secreção respiratória. Também é realizado um exame de imagem, geralmente tomografia.
Seis pessoas do grupo contraíram a “doença da caverna” de uma vez, em Resende
Arquivo pessoal
Entre os exames para diagnóstico, Teresa chegou a fazer tomografia na segunda vez que esteve no pronto-socorro – na primeira, foi diagosticada com virose. “O médico viu a tomografia e disse que era pneumonia. E eu perguntei: não seria histoplasmose? Como havia estado em uma caverna já imaginei que fosse”, diz.
A doença tem cura e é tratada por meio de antifúngico endovenoso de 2 a 3 semanas e oral por até três meses. “Em quatro meses, eu subi o Monte Roraima”, conta Teresa.
Segundo a infectologista, a histoplasmose pode gerar sequelas respiratórias. “Mas nada que comprometa a sua vida”, afirma. Teresa tem calcificações no pulmão que não interferem em sua capacidade respiratória.
O fungo estimula a formação de granulomas, inflamação em forma de nódulos. Trata-se de uma reação imunológica do corpo para expulsar os micro-organismos do pulmão. “Eventualmente os fungos podem se espalhar pela corrente sanguínea e se tornar uma doença disseminada, depende do grau de defesa do organismo. Isso ocorre com mais frequência em pessoas imunodepressivas [sistema imunológico vulnerável]”, explica.
Estresse aumenta risco da doença
Rosana explica que esse seria o caso dos “meninos da caverna”. A baixa imunidade teria sido provocada pela desnutrição – falta de alimentação por nove dias – e pelo estresse a que foram submetidos. “O estresse influencia na resposta imune. O interessante nesse caso é que eles praticaram meditação para controlar a mente e o gasto energético. Isso pode ajudar”, diz.
De acordo com Marcelo Rasteiro, gestor da Sociedade Brasileira de Espeleologia, a caverna onde os meninos ficaram confinados não é um ambiente propício à proliferação da histoplasmose. “Em uma caverna alagada, é pouco provável que tenham contraído essa doença porque o contágio se dá por meio da inalação de esporos do fungo e eles têm que estar em suspensão no ar, em uma caverna seca. Essa doença é como se ‘embolorasse o pulmão’. A maior chance de contágio ocorre em quem trabalha com galinheiro e em demolição”, explica.
Já a infectologista afirma, que embora o ambiente seco favoreça a disseminação dos fungos no ar, por meio da poeira, é em solo úmido que eles crescem. “E não adianta entrar em caverna com máscara cirúrgica, porque ela não barra esses micro-organismos”, diz.
A prevenção, segundo ela, deve consistir em checar se há surto da doença na região onde está localizada a caverna e não entrar nela caso esteja com a imunidade baixa. “Quando uma pessoa não tem uma doença de base, quanto maior a quantidade de fungo inalada, maior o risco de desenvolver a doença”, afirma. Ela ressalta que locais dentro do Estado de São Paulo já registram micro-surtos da doença.
A histoplasmose não fica incubada, isto é, não há risco de contrair a doença e só desenvolvê-la após anos, em um quadro de baixa imunidade, como ocorre com a tuberculose.
Imagens mostram a complexa operação de resgate na Tailândia: