Quando a engenheira Gabriela dos Santos Silva, 27, chegou aos Hospital das Clínicas em São Paulo com febre amarela, ela apresentava o quadro mais grave da doença. A enfermidade, que pode acometer diversos órgãos do corpo, como pâncreas, cérebro e coração, tinha atacado o fígado e provocado uma hepatite fulminante – quando o fígado para de funcionar. Em coma hepático, sua única chance de sobrevivência era um transplante do órgão em questão de horas.

A cirurgia de transplante de fígado emergencial para febre amarela, então inédita no mundo, foi realizada pelo Hospital das Clínicas em São Paulo em 29 de dezembro, com sucesso. Depois de pouco menos de um mês na UTI, Gabriela já está no quarto. Passa pelas etapas previstas de recuperação pós-cirúrgica, como fisioterapia respiratória e motora, para readquirir a massa muscular perdida durante a internação, mas está “normal” – consciente e comunicando-se verbalmente. “Se não houver nenhuma intercorrência, no período de 10 a 15 dias, poderá ter condições de alta”, afirma Liliana Ducatti, cirurgiã da Divisão de Transplantes de Órgãos do Aparelho Digestivo do Hospital das Clínicas de São Paulo, que integra a equipe da operação.

“Se não houver nenhuma intercorrência, no período de 10 a 15 dias, poderá ter condições de alta”
Liliana Ducatti, cirurgiã do Hospital das Clínicas de São Paulo

Além de Gabriela, outros quatro jovens passaram pelo mesmo procedimento de forma bem-sucedida no HC. Esses pacientes têm entre 16 e 29 anos e foram infectados pelo vírus em Mairiporã e Franco da Rocha, na Grande São Paulo. Já oito não tiveram a mesma sorte. A cirurgiã explica que, nesses casos, fígados compatíveis não chegaram a tempo para os transplantes. “Quando recebemos um paciente em estado grave, temos que tomar uma decisão rápida se vai ou não precisar de transplante. Caso necessite, entrará como prioridade, indo para o topo da lista de espera”, diz. “O primeiro órgão compatível que chegar, com seu tipo sanguíneo, será ofertado a ele, pois é tão grave que pode morrer em horas”, completa.

“Quando recebemos um paciente em estado grave, temos que tomar uma decisão rápida se vai ou não precisar de transplante. Caso necessite, entrará como prioridade, indo para o topo da lista de espera”
Liliana Ducatti, cirurgiã do Hospital das Clínicas de São Paulo

Segundo ela, a diferença entre um transplante padrão e a o transplante inédito do HC é o fator emergencial. Um paciente que aguarda por um órgão passa por uma preparação que vai desde exames laboratoriais até orientação nutricional e apoio psicológico. Já um doente de febre amarela com hepatite fulminante não contará com tempo hábil para este preparo, além de apresentar maior risco de morte durante o procedimento. “Geralmente o risco é maior, pois está num quadro muito grave, muitas vezes já inconsciente, respirando por aparelhos. A cirurgia basicamente não muda muito, o que muda é a gravidade do doente”, diz a médica.

Antes de Gabriela, esse tipo de cirurgia era considerada impossível. Isso porque nunca havia aparecido um caso como este. “Muitos pacientes com febre amarela que chegam ao hospital estavam em falência hepática. Então foi aventada a possiblidade de se fazer um transplante nesses casos”.

“A cirurgia basicamente não muda muito, o que muda é a gravidade do doente”
Liliana Ducatti, cirurgiã do Hospital das Clínicas de São Paulo

Liliana ressalta que somente 15% dos casos de febre amarela evoluem para a forma grave da doença, que pode levar à morte. Ela explica que “cada pessoa desenvolve a doença à sua maneira”. “Não há como prever”. O vírus circula no organismo por cerca de sete dias – a chamada fase de viremia. Desde o início do ano, o HC recebeu mais de 60 doentes. Devido à grande demanda, o hospital criou um fluxo: os pacientes que apresentam gravidade média em decorrência da febre amarela são encaminhados para o Instituto de Infectologia Emílio Ribas; os doentes graves são internados no Hospital das Clínicas e os mais graves, já com o fígado acometido, são direcionados para a área de transplante do órgão. “Hoje há casos graves no Hospital das Clínicas, mas na UTI de transplante, esperando por um fígado, não. Mas isso muda muito”, afirma.

“Cada pessoa desenvolve a doença à sua maneira”
Liliana Ducatti, cirurgiã do Hospital das Clínicas de São Paulo

Ela ressalta que é possível pacientes graves evoluírem para a cura sem a necessidade de transplante. “Por essa razão, os mantemos em observação com acompanhamento minuto a minuto”. Na semana passada, esta equipe médica do Hospital das Clínicas compartilhou sua experiência com outros 11 centros médicos do país por meio de videoconferência. Depois do HC, outros hospitais fizeram esse tipo de procedimento, no entanto, as experiências não foram bem-sucedidas, informa a médica.

 

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