A professora Débora decidiu enfrentar o preconceito e a falta de informação
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Os últimos dias têm sido corridos para a professora Débora Seabra, 36, que vive em Natal, no Rio Grande do Norte. São dezenas de entrevistas todos os dias. Jornais, rádios, televisão, jornalistas do Brasil inteiro querem falar com a mulher que enfrentou o preconceito e a desembargadora Marília de Castro Neves Vieira, da 20ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.

A magistrada divulgou notícias falsas sobre a vereadora Marielle Franco (PSOL), assassinada no dia 14 de março junto com o seu motorista, Anderson Gomes e postou comentários preconceituosos contra a professsora.

No Facebook, ela contou que ouviu no rádio que o Brasil é o primeiro país a ter uma professora com síndrome de Down e concluiu:

“Aí me perguntei: o que será que essa professora ensina a quem???? Esperem um momento que fui ali me matar e já volto, tá?”

A professora Débora afirma que, assim que soube do comentário, ficou chateada e decidiu fazer algo respeito. Ela diz que considerou importante se manifestar porque é preciso acabar com o preconceito. “Preconceito é crime e quem discrimina é criminoso”.

A resposta foi publicada na mesma rede social, no dia 19 de março. Em uma carta escrita à mão, Débora fala que ensina muitas coisas para as crianças. “A principal é que elas sejam educadas, tenham respeito pelas outras, aceitem as diferenças de cada uma, ajudem a quem precisa mais”.

A luta contra o preconceito

Débora com a família no dia em que recebeu o Prêmio Darci Ribeiro de Educação
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Esta não é a primeira vez que Débora chama a atenção ao falar sobre preconceito. Em 2014, foi convidada a falar sobre o assunto em uma reunião da Organização das Nações Unidas (ONU) em Nova York.

No ano seguinte, foi a vencedora do Prêmio Darci Ribeiro de Educação. A isso se somam participações em simpósios e congressos no Brasil e em outros países, como Argentina e Portugal.

Construir esta história de sucesso não foi fácil. A professora precisou lutar por espaço desde muito nova. Na escola, sofreu com a falta de aceitação e o preconceito dos colegas. Durante o curso de magistério, chegou a sair da sala quando percebeu que não seria bem recebida em nenhum dos grupos formados para a realização de uma atividade.

“Foi no segundo ano do curso. Eu tive que sair da sala e dizer que iria fazer greve, só voltaria se fosse aceita. Eu precisava voltar para terminar o curso, mas também precisava ser respeitada”, lembra Débora.

Foi assim, com coragem e determinação, que ela fez com que os colegas percebessem que ela era igual e capaz de estar ali.

Foi durante um estágio em escola particular de Natal que ela se apaixonou pelas crianças e decidiu se dedicar à educação infantil. Hoje, é professora auxiliar e ajuda a ensinar crianças entre 3 e 4 anos.

Entre os conteúdos e as brincadeiras, ela sabe bem qual é a lição que quer passar para os alunos: “O mais importante é ensinar que o preconceito está errado”.

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O papel da família

Quando fala dos pais e do irmão, Débora faz questão de reconhecer o papel da família. “É meu porto seguro”, diz.

Quando Débora nasceu não existiam especialistas no Rio grande do Norte
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Mas a sua mãe, a advogada Margarida Seabra, lembra bem como foi difícil receber a notícia de que a filha tinha síndrome de Down. Ela afirma que, no início da década de 1980, não existiam especialistas em Down no Rio Grande do Norte.

“Há 36 anos, quando a Débora nasceu, foi uma hecatombe. Ninguém tinha uma Débora para a gente se espelhar, para ver o que fazer. Ela sabe disso, eu cheguei a desejar que ela morresse, mas tudo mudou quando eu vi quanta vida ela tinha pela frente. A gente decidiu oportunizar para ela tudo o que se oportuniza para uma filha. Eu decidi que ela era a minha filha e teria tudo o que qualquer filha teria. Ela cresceu e o amor se sobrepôs à deficiência”, conta a mãe, emocionada.

Depois da turbulência, a família decidiu tratar a menina como uma criança tão capaz quanto todas as outras. Durante toda a vida escolar, frequentou uma escola regular, o ensino especial nunca foi cogitado. Em casa, ela era tão cobrada quanto o irmão um ano mais velho.

“Nós nunca tivemos preconceito. Tivemos, sim, a dor de ter um filho diferente, que não sabíamos como educar, mas com amor fomos descobrindo o caminho e, hoje, ela devolve todo o nosso esforço com amor e sucesso. Ela é uma mulher que faz a história”, fala, orgulhosa, dona Margarida.

Em 2016, Débora foi a responsável por acender a tocha paralímpica
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O que é a síndrome de Down

A síndrome de Down é uma alteração genética, um cromossomo a mais no par de número 21, por isso o problema também é conhecido como trissomia 21.

Essa alteração genética afeta o desenvolvimento da pessoa e determina algumas características físicas e cognitivas como orelhas mais baixas, língua mais grossa e pesada, olhos puxados, fraqueza muscular e atraso no desenvolvimento motor.

Tanto o desenvolvimento físico quanto o desenvolvimento cognitivo e intelectual são mais lentos em uma criança com síndrome de Down do que nas outras crianças, mas isso não significa que uma criança com a síndrome não consiga aprender a ler, escrever e não seja capaz de estudar e ter uma profissão.

A pediatra Ana Cláudia Brandão, do Centro de Especialidades Pediátricas, do Hospital Israelita Albert Einstein, explica que o papel da família nessa evolução é fundamental.

“A familia tem uma importância absurda para qualquer criança, uma criança sem afetividade, sem o amor da família, não se desenvolve bem. Falando em criança com deficiência, certamente, esse apoio faz um pouco mais de diferença. A gente ainda vive em uma sociedade onde a insistência dos familiares é fundamental para a criança ocupar seu espaço”, explica a médica.

A pediatra também lembra que a legislação brasileira garante a educação inclusiva, mas lamenta: “Na prática isso não acontece de forma espontanea, é preciso que a família reconheça a importância da criança crescer incluída nos espaços, nos clubes, igrejas, grupos, tem que reconhecer, acreditar que isso é possível e dar a ela as oportunidades de inclusão”.

O processo de educação de uma criança com down pode ser desgastante, a família precisa ter forças para lutar contra a falta de informação. Educação inclusiva não é uma novidade, o Brasil discute o assunto há 20 anos, segunda a pediatra, mesmo assim algumas escolas ainda recusam alunos com o argumento de que não estão preparadas para receber uma criança com a síndrome. “As escolas já deveriam ser pcapazer de receber e fazer um bom trabalho, já deveriam estar preparadas para isso”, afirma Ana Cláudia Brandão.

 

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